Quando eu deixar de sonhar
com os murmúrios do mar,
…E o meu peito cansado
deixar de beber o perfume da
maresia,
Quando eu não mais sentir a
caricia
do brilho cintilante do sol,
…E deixar de criar a minha
poesia
com o romantismo do luar,
Quando eu perder a emoção
ao ver nascer a alvorada
matizada,
…E deixar de admirar e pisar
as pedras gastas das
calçadas,
Quando eu não mais me
sensibilizar
com os aromas da natureza,
…E os abraços não me
encontrarem,
Quando os sorrisos ficarem
sem resposta,
…E as minhas palavras se
calarem…
Talvez eu tenha deixado de
ser matéria
e num lampejo metafisico
esteja em outro caminho…
E se forem dar-me um abraço
à ultima carruagem
onde farei a minha derradeira
viagem,
Não se despeçam do meu corpo
inerte, chorando
desejo sim, ouvi-los
alegres, cantando,
Não se preocupem com flores
que eu até adoro…
Mas as flores murcham,
e secas, sem cor, são tão
tristes!
O que eu somente vos peço,
em especial aos que são verdadeiros
amigos,
é que unicamente me leiam…
Sim! Que digam poemas meus,
Que os sintam,
Para que eles se elevem
juntamente com a minha alma,
e leiam-me, se possivel,
amigos
com o trinar de uma guitarra
como fundo,
Mas, por favor…sem hipocrisia,nem
cinismo
falsidades que eu vi e
senti,
tantas e tantas vezes por aí!
Ah…também dispenso os
piedosos elogios
que me queiram prestar
agora,
se eu era merecedor deles,
deveriam ter-me dado em vida!
Sabem…
Quanto a flores…depois de
murchas
são ignoradas e esquecidas,
O que não acontecerá quando
me lerem
por que esse momento ficará
marcado
para sempre nas vossas
mentes,
se honestamente o fizeram
com sentimento
E eu, creio sinceramente
que assim, a minha etérea
viagem
será mais serena…
Pois penso ir ao encontro
do saber despretensioso e
simples
dos verdadeiros poetas que
por lá tertulam,
Esquecerei as presunçosas
elites bacocas
que aqui neste espaço
terreno
se vestiam de seres
diferentes,
enchiam a boca de vaidade,
alimentavam-se de arrogância,
engalanavam-se de crispação
e riam com superioridade a
si próprios
numa lamentável demência da
consciência!
Se fizerem o que eu vos pedi,
companheiros da despedida,
eu, espiritualmente lá do
alto, vos bendigo,
com a humilde franqueza
que aqui neste chão
da minha efémera existência,
foi o meu caminhar pela vida.
José Carlos Moutinho